domingo, 31 de outubro de 2010

Longe de casa, perto de mim. No caminho.


Dedico este texto aos santos, loucos e malditos,
que tentando se encontrar se perderam e tentando 
se perder encontraram seu religare.

Por muitos meses, talvez por uns poucos anos, me senti como na música de Adriana Calcanhoto, não morando mais em mim. A vida e a rotina oferecem caminhos atrativos de se trilhar, lineares, até certo ponto, e é possível ser muito feliz seguindo nesta trilha, é desafiador e nobre escolher uma profissão, seguir ou não nela, encontrar alguém para ter ao lado e viver feliz para sempre, ou por uns dias e se preocupar com as contas que vencem todo mês. É perfeitamente possível se sentir alegre assim, mas, para mim, havia deixado de ser o suficiente. A substância acabara.

Não sei que nome dar à jornada realizada pelo exterior de minha rotina e pelo interior de mim, provavelmente o melhor título para estampar a capa de minhas memórias seja o de peregrinação. O peregrino é aquele que segue numa viagem em busca do sagrado, mas, principalmente, de si mesmo, (sendo o próprio eu o sagrado) dada esta definição do que seja um peregrino, creio me ajustar confortavelmente nela. 

Minha busca pelo sagrado diferiu da usualmente conhecida em alguns pontos, o que me remete ao filme do Bergman, o Sétimo Selo, em que o cavaleiro que perdeu a esperança de encontrar a Deus resolveu procurar pelo Diabo, somente para confirmar a Deus. Meu Santo Graal era a busca de compreensão, mais que uma compreensão intelectiva, mas o entendimento do outro, que também sou eu. Uma vez que ser-humano é algo que partilhamos, é cabível, portanto, dizer, que saí em busca de mim. Parti rumo à minha cruzada pessoal, sem espada, escudo, armadura e, tampouco, inimigos, abri o coração para as feridas que adviessem do encontro comigo. Vivi, me permiti.

O coração voltou maior e cicatrizado pelo bálsamo de paisagens, pela grandiosidade do potencial humano de construir coisas belas, por odores e gostos, por gestos e muitos sons, pela percepção de que não importa onde estejamos, a música e a poesia são universais e estão entranhadas no mais belo lado do prisma que somos. Voltou cheio do amor que já não mais sentia por mim, com mais compreensão emotiva que racional, com o entendimento de que só nos tornamos inteiros quando partilhamos, seja carinho, confidências, chansons, germes de metrô ou um prato de comida.

Voltei a morar em mim e a gostar dessa casa reformada, mais aberta, arejada e iluminada, onde existe amor, compreensão e, finalmente, paz.

‘I went wandering’                       

0 comentários: