quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

Os mutantes (Parte II)


Quando nos tornamos essas megeras insensíveis, incapazes de perceber que o outro está cansado e precisa de espaço? Quando é que começamos a pensar que "você não me deu um beijo", "você me magoa", "não entende meus sentimentos"? Quando eles se tornam esses calhordas que justificam toda pisada de bola com "você me tirou do sério", "está sendo injusta comigo", "eu sou um anjo, por que não confia em mim?".

Mais difícil que responder essas perguntas é descobrir o momento que a corda foi rompida, o instante em que o véu caiu e, daí, a percepção de que as coisas mudaram. Tudo muda (salve Nietzsche!) mas, onde nós estávamos enquanto esse processo corria? Por que o choque súbito do "eu não te reconheço"?

Acho difícil conceber que, de uma hora para outra, um dos motivos de sua alegria se transformou num dos flagelos do apocalipse, creio que pelo fato dessa transformação não ter ocorrido de repente e menos ainda sem a participação da parte reclamante. Como diria meu amigo Bucha, citando alguém: "o processo é lento, mas o barato é louco" e na lentidão das transformações vamos nos ocupando do canal que não entra, da porta que emperra, da geladeira que precisa ser trocada e do trabalho maçante de todos os dias. Perdemos o trem da transformação, então, um dia acordamos, olhamos para o lado e pensamos: "não foi com ele que eu me casei" oras, se não foi com ele então com quem foi??? Mais do que ninguém, a pessoa com que se está é aquela que maior influência exerce nas transformações, podemos inferir, a partir disso, que pessoas que estejam em um relacionamento (não me refiro só a casais, mas também a outras esferas de relacionamento, como a familiar, de trabalho etc) criam os monstros que as assombram pelo tempo em que a coisa durar; se o tal do "te tornas responsável pelo que cativas" é real, como não nos apercebemos do que estamos criando? E depois reclamos de não "conhecermos mais" o dito cujo.

A chave que nos ajudará a responder essas perguntas está na longa duração, no vento que sopra um grão de areia hoje, outro amanhã e os desloca para outro lugar, até que um dia uma nova duna seja formada e o cenário modificado. O instante crucial da percepção está na leveza do vento que sopra.

Para os que temem o desafio das mudanças, o ideal seria considerar a embalsamação, em temperaturas e condições ideais pode se conservar alguém imutável por séculos, se você anda achando que todo mundo é bipolar ou sofre de desnível hormonal o mês inteiro, é um caso a se considerar.

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