Inda guardo renitente um velho cravo para mim

O que é uma nação sem memória? Tenho pensado muito a respeito da memória ultimamente, não naquela que me falta, mas na que escolhemos no conjunto de fatos, cheiros, sons e tudo o mais que resolvemos guardar nos recônditos da alma, do coração, do cérebro ou seja lá o nome do lugar pra onde vão as lembranças. Eu deveria ter lido mais a respeito quando tive oportunidade, mas não o fiz, o que de certa forma é bom, pois tornará este texto uma ocasião para reflexão primária.

O que escolhemos guardar, o que é digno ou não de se tornar memória? É fato que nem todas as coisas boas ou ruins das quais constituímos memória aconteceram exatamente da forma como nos lembramos, então acredito que dentre todas as perguntas a mais adequada seja: como construímos nossa memória? Certamente existem dezenas de respostas para a pergunta, bem como pessoas que dedicaram a vida a estudar o assunto, assim, se procuras alguma resposta para estas indagações te suplico, recorra a estes profissionais, pois quem escreve aqui é uma historiadora de pouca memória. Não gosto de olhar fotografias antigas e me incomoda ouvir histórias sobre quando eu ou algum familiar era criança, talvez esse incômodo venha da cisma que sempre tive em relação ao contar histórias, elas parecem menos verídicas cada vez que são contadas. As fotos não mudam, mas minha percepção sobre o evento sim. Talvez meu problema não seja com a memória, mas com a volatilidade das coisas e o despertar de emoções que revirar o passado provoca.

Concordo que as recordações são as flores da primavera que colhemos no inverno da vida. Chegou o momento de parar de me preocupar com o processo cognitivo e fazer mais para ter as ditas flores na estéril estação, olhar para uma despensa vazia é muito triste. Ver que a vida não foi nada mais que a simples repetição de um dia monótono equivale a não ter existido. Quero a alegria de um depósito abarrotado com lembranças felizes, momentos difíceis, de rostinhos gentis e broncas que me fizeram amadurecer, cheia de superações e dos meus vacilos. Desejo mais fotografias para nelas construir a memória que eu quiser, para fazer a alegria durar para além do papel e a tristeza ser apenas lembrança. Quero memória, quero ter o que lembrar e o que esquecer. Se não ficar o fato, que fique a sensação, sempre insistente.

Hora de plantar as flores, muitas, de vários tipos; aparar os espinhos e respirar o perfume delicado que deixarem em minhas mãos quando o inverno da vida chegar.

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